Notícias Recentes Sobre Paleoantropologia
Além de apresentar informações sobre as atividades do LEBIOS e da área de bioantropologia e outras do LEBIOS e do PPGA, este espaço também nos mantém informados sobre as novidades do nosso campo.
Este mês destacamos alguns temas sobre paleoantropologia:
104 Anos do Homo rhodesiensis. Um emblemático fóssil de nossos ancestrais e a controvérsia entre Zâmbia e Inglaterra.
No dia 17 de junho de 1921, nas minas de cobre e alumínio na região central conhecida como Kabwe, na então Rodésia, atual Zâmbia, que era uma das colônias inglesas, na mina de Broken Hill, o Suíço T. Zuigelaar, diretor do projeto mandou sua equipe local explodir uma carga de dinamite para desalojar os minerais do solo. Quando a fumaça se dissipou os trabalhadores identificaram um crânio praticamente intacto, que foi levado para estudos no Museu Britânico, onde permanece até hoje.
Crânio do Homo heidelbergenses. Acervo Projeto Homo Ludens. |
Assim foi encontrado um dos crânios mais emblemáticos da história evolutiva humana. Apelidado de Kabwe 1, ele recebeu vários nomes ao longo dos últimos cem anos como Homo rhodesiensis, Homo bodoensis, Homo heidelbergensis e até Homo neanderthalensis. Embora a localização exata do achado tenha se perdido no tempo, as últimas datações no material indicam uma idade aproximada de 300 mil anos. É desse mesmo período o crânio de Jabel-Irhoud, no Marrocos, considerado, até o momento, o exemplar mais antigo de Homo sapiens.
Kabwe 1 é um dos primeiros achados de ancestrais humanos no século XX e suas características, combinam traços de Homo erectus, neandertais e sapiens. Seu local de origem, no sul do continente africano, o coloca no centro de intensos debates sobre as relações filogenéticas entre os nossos ancestrais e a nossa espécie. Além disso, há décadas a Zâmbia reivindica o retorno do fóssil ao país e a Inglaterra se recusa a devolver, reiterando uma postura colonialista em relação aos países que outrora explorou. Neste aniversário de 104 anos, a Zâmbia não tem ainda o que comemorar. O Museu Britânico tem se negado a dar notícias sobre o andamento das negociações com o governo zambiano
Atualmente a maioria dos pesquisadores atribui o crânio ao grupo do Homo heidelbergensis, junto com a famosa mandíbula de Mauer. Utilizamos aqui o primeiro nome atribuído ao espécime africano, pelo paleontólogo britânico Sir Arthur Smith Woodward, em 1921, que alguns pesquisadores consideram pertinente restaurar.
Para saber mais:
Musonda, F.B. (2022). Decolonising the Broken Hill Skull: Cultural loss and a pathway to Zambian archaeological sovereignty. Afr Archaeol Rev (2013) 30:195–220.
Roksandic, M. et al. Resolving the “muddle in the middle”: The case for Homo bodoensis sp. nov. Evolutionary Anthropology, 31:20-29.
Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos da USP Lança Museu Virtual de Evolução Humana
Como pode ser visto na página de abertura do Museu (https://evolucaohumana.ib.usp.br/), “As perguntas ‘quem somos?’ e ‘de onde viemos?’” sempre intrigaram a humanidade. Assim, aprender sobre nossas origens e evolução nos ajuda a responder a essas questões do ponto de vista científico e a nos entender, enquanto Homo sapiens, como sendo produto de uma longa e interessantíssima história evolutiva iniciada na África há cerca de sete milhões de anos.”
O Museu apresenta o acervo de réplicas que foi inicialmente adquirido pelo Prof. Walter Neves, criador do LEEH, e que continua a ser curado e ampliado pela Profa. Mercedes Okumura e seus estudantes (https://www.instagram.com/p/DKxB9BjsuHt/?igsh=NXMwMXk5dmI3aWdi). O site faz uma viagem no tempo através das réplicas e das informações associadas a cada um dos recursos disponíveis na USP, e também oferece materiais para empréstimo para fins educacionais, o que é extremamente importante para a difusão do ensino de evolução humana. Vale a pena visitar.
Novas Descobertas da Genética Sobre Evolução Humana
O Menino do Lapedo
O Menino do Lapedo, Portugal, cujo esqueleto foi encontrado em 1998 em uma gruta em Portugal, é um dos fósseis mais emblemáticos do século XX. Segundo recente datação utilizando análise de hidroxiprolina a partir de colágeno, a criança, que tinha 4 ou 5 anos quando faleceu, viveu entre 27.780 e 28.550 anos atrás. Embora tenha vivido em tempos recentes, agora se tem comprovação molecular que se trata de um híbrido entre Homo sapiens e Homo neanderthalensis. Há anos paleoantropólogos, como o britânico Chris Stringer, utilizando análises bioantropológicas já tinham indicado que a Criança do Lapedo apresentava marcas físicas desse cruzamento, como uma mandíbula massiva e pernas curtas típicas dos neandertais, mas também um crânio arredondado e um queixo definido, características dos humanos modernos. Agora se sabe que estes traços são a prova de um cruzamento genético que ocorreu durante muitas gerações.
A descoberta deste fóssil e os rituais funerários a ele associados evidenciam que o ser humano moderno não é fruto de uma evolução linear, mas resultado de um complexo processo de interação entre espécies e suas culturas. Já não há dúvida na ciência que os neandertais não desapareceram. Segundo dados genéticos, todos humanos modernos não africanos têm cerca de 1% a 2% de DNA neandertal. Em outras palavras, eles se fundiram na nossa linhagem, vivem ainda nos nossos genes e, portanto, em nossas emoções, medos ancestrais, gestos e comportamentos.
A história evolutiva humana não é a de uma única espécie dominante, mas a de cruzamentos e zigue-zagues e entrelaçamentos, de um legado comum que estamos começando a compreender.
Para saber mais:
Linscott, B. et al. (2025). Direct hydroxyproline radiocarbon dating of the Lapedo child (Abrigo do Lagar Velho, Leiria, Portugal). Science Advances, 11(10): https://www.science.org/doi/10.1126/sciadv.adp5769
O Homo longi
Um crânio chinês emblemático apareceu no cenário paleoantropológico mundial em 2018. Suas características morfológicas únicas evidenciaram tratar-se do exemplar de uma população que ainda não havia sido descrita, mas que viveu em período contemporâneo ao Homo sapiens, cerca de 146 mil anos atrás. Por isso os pesquisadores lhe atribuíram uma nova espécie: Homo longi. Agora um esforço científico de vários países conseguiu extrair DNA desse crânio e o resultado surpreendeu: segundo os dados encontrados, o crânio de Harbin, pertence a um indivíduo do grupo dos Denisovanos, colocando finalmente uma face, de fato um crânio inteiro, nesse grupo elusivo, que foi descrito inicialmente através apenas de seu DNA, obtido de um ossinho de dedo da mão.
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Crânio e reconstrução facial do "Homem Dragão" ou "Homo longi". Wikicommons. |
Essa descoberta cria uma luz e um dilema nos debates paleoantropológicos: a luz é que agora sabemos como se pareciam os denisovanos e podemos com essa informação buscar compreender melhor suas relações morfológicas, geográficas e filogenéticas com os outros grupos de ancestrais humanos. O dilema é qual nome científico será dado a este grupo, o que irá gerar ainda muitos debates. Possivelmente, se forem seguidas as normas de nomenclatura zoológica, o nome será Homo longi, ficando “Denisovanos”, como o nome popular, como é o caso de “Lucy” (Australopithecus afarensis), do “Garoto de Turkana” (Homo ergaster), ou de Kabwe 1 (Homo heidelbergensis). Saberemos em breve.
Para saber mais:
Hunt, K. (2025). DNA do "Homem Dragão" revela rosto de grupo misterioso de humanos antigos. CNN Brasil. https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/dna-do-homem-dragao-revela-rosto-de-grupo-misterioso-de-humanos-antigos/
Uso de Impressão 3D para Ensino de Evolução Humana no Brasil
O uso de impressoras 3D para confecção de materiais didáticos ainda é uma novidade no Brasil. Embora as impressoras 3D já sejam relativamente comuns no país e muitas escolas e instituições de ensino possuam esses equipamentos, este ainda permanece ocioso ou subutilizado em muitos casos.
O Projeto de ensino, pesquisa e extensão “Homo Ludens” (PHL), uma parceria entre o Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares (CEAM), o Laboratório de Comunicação Não-Verbal do Instituto de Psicologia e o Instituto de Biologia (IB), da Universidade de Brasília (UnB), e o LEBIOS/CNPq, iniciaram em 2023 uma série de experimentos de impressão e aperfeiçoamento das técnicas e tecnologias 3D necessárias para a confecção das primeiras réplicas de fósseis hominíneos em tamanho natural no Centro Oeste brasileiro.
Logo do Projeto Homo Ludens. Acervo Projeto Homo Ludens. |
Atualmente o PHL já conta com réplicas de alta qualidade de fósseis das várias fases da história evolutiva humana, como Australopithecus afarensis, Paranthropus boisei, Homo habilis, Homo ergaster, Homo erectus, Homo neanderthalensis, Homo heidelbergensis, e Homo sapiens, materiais de pós-crânio e artefatos líticos que têm sido usados extensamente para ensinar evolução humana na UnB e em escolas do Distrito Federal.
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Parte do acervo inicial do PHL. Acervo Projeto Homo Ludens. |
Com a ampliação recente do número de impressoras do PHL, há planos para replicar e distribuir kits destas réplicas em diversas escolas de ensino médio do Distrito Federal e o projeto tem interesse em estabelecer parcerias com outras instituições e estados. O PHL tem oportunizado aos estudantes utilizar, pela primeira vez, réplicas de alta qualidade, produzidas com a mais recente tecnologia, a baixo custo, para aprender sobre evolução humana e ciência no Brasil Central. O projeto também contribui para apoiar a educação antirracista ao evidenciar durante as aulas a ancestralidade da origem humana no continente africano.
Quem tiver interesse em conhecer mais sobre o PHL pode seguir as notícias mais recentes no Instagram do projeto: https://www.instagram.com/homoludens_projeto/
Para saber mais:
Campedelli, B.C., et al., (2024) HOMO LUDENS: Utilizando Jogos de RPG e Impressão 3D no Ensino Transdisciplinar em Ciências e Evolução. Anais do VII Congresso de Inovação e Metodologias no Ensino Superior e Tecnológico. UFOP: Centro de Artes e Convenções da UFOP, Ouro Preto, MG, 12-13/09/2024. Disponível em: https://www.even3.com.br/anais/viicim2024/835239-homo-ludens--utilizando-jogos-de-rpg-e-impressao-3d-no-ensino-transdisciplinar-em-ciencias-e-evolucao/
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